Jacques Lacan esforçou-se para responder algumas questões sobre a vergonha em uma lição de seu Seminário “O avesso da psicanálise”, a qual constitui sua maior contribuição sobre o tema. Muitas teses ali se esbarram, das quais tentarei aqui verificar o alcance na prática psicanalítica, bem como no laço social contemporâneo. Desse cruzamento, já destacamos o diagnóstico estabelecido nesse Seminário: não há mais vergonha, atrás da qual, todavia, uma “vergonha de viver” afetaria secretamente o sujeito moderno. Assim, incumbe a Lacan concluir: “É isto que a psicanálise descobre”. Tratarei neste livro de esclarecer essas razões, mas também de fazer valer aqui o inédito da oferta analítica. Dessa forma, ali onde protesta o dizer do sujeito da vergonha “oh, não!”, que ele seja risonho ou silencioso, permitir que advenha um saber. Não é essa a aposta da psicanálise? Freud não teria a isso se oposto, pois teria feito da associação livre a “promessa” de não ceder à vergonha, mas antes de aprender com ela.
David Bernard
Pratica psicanálise em Rennes (França). É membro da Internacional dos Fóruns – Escola de Psicanálise do Fórum do Campo Lacaniano (IF-EPFCL), professor e pesquisador de psicopatologia na Universidade Rennes II. É autor de La différence du sexe (2021, Éditions Nouvelles du Champ Lacanien), foi organizador de Lacan avec Wedekind (2019, Éditions PUR) e coeditor, com Alexandre Levy, de Pas de limite? Approche psychanalytique de la vie moderne (2021, Éditions PUR).
Ana
quarta-feira, 5 de junho de 2024
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