
A questão do analfabetismo funcional no Brasil
Segundo pesquisa, 29% da população não compreende os textos que lê.
Publicado em 6/4/2025
Leitura Digital
Evolução cognitiva ou perda de compreensão profunda? Estudos recentes revelam o impacto da leitura digital.
Lemos o mesmo em uma tela e em um pedaço de papel? A resposta, cada vez mais apoiada pela ciência, é: não. Nas últimas duas décadas, a leitura digital tornou-se uma prática diária para estudantes universitários, professores e pesquisadores. Contudo, essa mudança de formato não apenas transformou a maneira como acessamos o conhecimento, mas também o modo como o processamos, entendemos e retemos.
É hora de falar seriamente sobre os leitores digitais universitários: estudantes que navegam entre as guias, leem pequenos fragmentos, interagem com textos multimodais e sintetizam informações de várias fontes. Esse ambiente de leitura exige habilidades diferentes daquelas que tradicionalmente associamos à leitura profunda e linear e, como resultado, surgiram duas questões críticas: estamos desenvolvendo novas habilidades cognitivas? Ou estamos perdendo a capacidade de nos concentrar e entender em longo prazo?
Este artigo explora o que a neurociência da leitura diz sobre essas mudanças, quais habilidades cognitivas estão surgindo em ambientes digitais e como elas afetam – positiva ou negativamente – a compreensão da leitura. Também analisaremos as tensões entre leitura fragmentada e leitura profunda, e o papel de liderança que a educação universitária tem na formação de leitores digitais críticos, conscientes e adaptáveis.

Os estudantes universitários de hoje crescem e são educados em um ambiente saturado de estímulos digitais. Não é mais estranho para eles estudarem em um laptop enquanto ouvem um podcast, consultam um PDF no celular e fazem anotações em um app colaborativo. A leitura acadêmica não é mais uma atividade linear, sustentada e silenciosa: agora é fragmentada, multitarefa e hipertextual.
Esse novo modo de leitura responde tanto aos formatos disponíveis quanto às demandas do ambiente educacional digital. Os leitores digitais universitários têm todas as informações de que precisam na ponta dos dedos, mas, ao mesmo tempo, estão constantemente expostos a várias janelas, guias abertas, hiperlinks e notificações constantes. Nesse contexto, a capacidade de filtrar informações, localizar ideias-chave rapidamente e sintetizar conteúdo de várias fontes torna-se mais importante do que memorizar detalhes.
No entanto, também surgem desafios. Muitos alunos experimentam fadiga cognitiva, dispersão da atenção e dificuldade em manter o foco na leitura extensiva. Embora tenham desenvolvido habilidades valiosas para interagir com o conteúdo digital, nem sempre possuem estratégias para se aprofundar em textos, refletir criticamente ou avaliar a qualidade das fontes.
Para o professor universitário, isso representa um duplo desafio: reconhecer as novas habilidades que os alunos já adquiriram – como navegação rápida ou leitura em camadas – e, ao mesmo tempo, orientá-los a fortalecer habilidades que podem estar se enfraquecendo, como leitura sustentada, concentração profunda e compreensão crítica.
Acompanhar esse processo não implica rejeitar a leitura digital, mas entender como ela funciona cognitivamente e como pode ser mais bem utilizada em contextos acadêmicos exigentes.
A leitura é um processo complexo que ativa várias redes cerebrais ao mesmo tempo: atenção, memória de trabalho, processamento da linguagem e tomada de decisão. Mudar o suporte – do papel para a tela – não é um detalhe menor; estudos recentes em neurociência cognitiva começaram a mostrar como essa mudança afeta tanto a maneira quanto a profundidade com que lemos.
Por exemplo, verificou-se que a compreensão de leitura em telas tende a ser menor, especialmente quando se trata de textos longos. O cérebro, condicionado pela natureza interativa e fragmentada dos ambientes digitais, pode ter mais dificuldade em manter o foco e construir uma representação mental coerente do conteúdo.
A famosa acadêmica e especialista em neurociências da leitura, Maryanne Wolf, alertou que o hábito de ler digitalmente pode estar moldando um tipo de leitor mais rápido, mas menos reflexivo. O movimento constante entre estímulos, links e janelas gera a leitura no modo de varredura, que embora treine certas habilidades cognitivas, como localização de informações ou multitarefa, pode limitar o pensamento crítico e a empatia que são desenvolvidos com a leitura profunda.
Outros estudos mostraram que simplesmente ler em uma tela pode induzir uma percepção de menor dificuldade cognitiva, levando a uma leitura mais superficial. Ou seja, os leitores tendem a acreditar que entendem bem, quando na realidade estão se lembrando menos e se aprofundando pouco. Isso não significa que a leitura digital seja “ruim”, sobretudo quando levamos em conta que, graças a ela, milhões de alunos podem acessar recursos de treinamento incrivelmente valiosos, mas que ela opera sob uma lógica diferente e requer o desenvolvimento de novas estratégias mentais. Compreender esses mecanismos é essencial para adaptar o ensino universitário atual, promover uma leitura mais consciente e treinar usuários que saibam quando parar, aprofundar ou mudar de ritmo dependendo do objetivo da leitura.
Longe de focar apenas em seus efeitos negativos, temos de admitir que a leitura digital também está gerando um conjunto de habilidades cognitivas adaptadas às demandas dos ambientes virtuais. Essas habilidades não substituem aquelas associadas à leitura tradicional, mas refletem uma evolução na maneira como processamos as informações ao ler nas telas.
Refere-se à capacidade de percorrer rapidamente um texto em busca de informações importantes. Essa técnica, antes representativa de leitores rápidos especializados, tornou-se uma prática diária entre os leitores digitais universitários. Seu desenvolvimento está relacionado à velocidade de identificação de palavras-chave, títulos, hiperlinks ou gráficos relevantes em conteúdo extenso.
Em um ambiente em que os alunos consultam múltiplas fontes digitais – blogs, artigos, vídeos e infográficos – torna-se essencial saber integrar diferentes fragmentos para construir uma ideia coerente. Essa capacidade de vincular conceitos díspares é uma competência essencial para a pesquisa acadêmica atual.
Entende-se como a capacidade de alternar entre tarefas relacionadas – ler, fazer anotações, procurar referências, contrastar dados – sem perder o fio condutor. Embora essa habilidade tenha um limite e possa induzir fadiga se houver exagero, seu desenvolvimento moderado pode ser útil em ambientes educacionais complexos.
Por fim, o contexto digital aprimorou formas de leitura não sequencial ou leitura em camadas, que permitem ao leitor adaptar seu envolvimento um texto de acordo com seu objetivo: primeiro explorar títulos e subtítulos, depois ir para o conteúdo principal ou pesquisar diretamente em seções específicas. Essa flexibilidade requer um alto nível de autorregulação e pensamento estratégico. Essas novas habilidades cognitivas não são melhores nem piores do que as tradicionais: elas são diferentes. E entender sua lógica é fundamental para integrá-las criticamente à educação universitária.

Durante anos, foi mantida a ideia de que a leitura no papel favorece uma melhor compreensão do que a leitura na tela. A leitura profunda envolve concentração sustentada, análise detalhada, inferência e reflexão crítica. Esse tipo de leitura possibilita construir significados complexos, conectar ideias, interpretar nuances e desenvolver empatia em relação a outras perspectivas, por isso é uma prática essencial para o pensamento acadêmico e a formação integral do aluno.
Todavia, embora vários estudos sustentem a relação entre a leitura em formato impresso e a compreensão profunda, a realidade é mais complexa, pois isso não depende apenas do meio, mas de múltiplos fatores: o tipo de texto, a interface, o ambiente, as habilidades prévias do leitor e, em especial, as estratégias utilizadas.
A leitura fragmentada, por outro lado, é caracterizada por saltos frequentes entre textos, janelas e plataformas. Não segue uma ordem linear, mas é construída a partir de fragmentos curtos e conexões hipertextuais. Essa forma de leitura estimula habilidades como varredura, pesquisa rápida e capacidade de síntese.
Fatores como cansaço visual, rolagem contínua da tela ou falta de referências espaciais também podem dificultar o acompanhamento do texto. Entretanto, muitas dessas dificuldades podem ser compensadas com boas práticas de design digital e treinamento em estratégias metacognitivas.
Embora muitos estudos apontem que a leitura digital pode dificultar a profundidade, também é verdade que essa dificuldade não é inerente ao meio, mas à forma como ela é utilizada. Com as estratégias certas, é possível aprimorar a leitura digital profunda, desde que seja fomentado um ambiente propício: sem distrações, com objetivos claros e com acompanhamento pedagógico.
Pesquisas recentes mostram que, quando os alunos são treinados para ler em telas com atenção plena e objetivos definidos, seu nível de compreensão pode corresponder ao da leitura no papel. Por outro lado, em contextos de distração ou leitura superficial, a compreensão costuma ser afetada, principalmente em textos longos ou com estrutura complexa.
O tipo de tarefa também influi. Para leituras curtas ou busca de informações específicas, as telas costumam ser melhores. Porém, para textos argumentativos, literários ou filosóficos que exigem interpretação, inferência e memória de longo prazo, o papel ainda tem uma ligeira vantagem, especialmente se o leitor não estiver acostumado a prender sua atenção digitalmente.
Em vez de confrontar as duas formas de leitura, o desafio é integrá-las. Um leitor universitário precisa desenvolver a capacidade de ler digitalmente de maneira crítica e consciente: sublinhar, pausar, reler, anotar ideias-chave e evitar distrações, bem como transitar entre a leitura dinâmica e a leitura profunda, sabendo quando aplicar cada uma de acordo com o objetivo acadêmico. Assim como aprendemos a ler livros impressos na infância, agora é necessário treinar os alunos para o uso eficiente e aprofundado de textos digitais.
A leitura digital veio para ficar. Em vez de se adaptar a ela de maneira improvisada, as universidades hoje têm a oportunidade – e a responsabilidade – de formar leitores digitais críticos, capazes de aproveitar as vantagens do ambiente digital sem sacrificar a compreensão profunda ou o pensamento analítico.
Isso implica não apenas integrar a tecnologia, mas também acompanhá-la com estratégias pedagógicas que ensinem a ler na tela com atenção, propósito e critério, preparando os alunos para identificar fontes confiáveis, alternar entre modos de leitura e construir conhecimento a partir de múltiplos formatos.
Nesse processo, ter ferramentas projetadas especificamente para o aprendizado universitário faz uma grande diferença. A Biblioteca Virtual Pearson, por exemplo, oferece a professores e alunos um ambiente acessível, dinâmico e pedagogicamente estruturado, que favorece tanto a exploração fragmentada quanto a leitura profunda.
Conheça algumas de suas funcionalidades:
A leitura digital continuará a crescer, e as universidades que estão comprometidas com soluções como a Biblioteca Virtual Pearson não apenas otimizarão seus recursos educacionais: elas também treinarão leitores críticos e versáteis preparados para os desafios cognitivos do presente e do futuro.
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REFERÊNCIAS
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WYLIE, J.; THOMSON, J. M.; LEPPÄNEN, P. H. T.; ACKERMAN, R. Cognitive processes and digital reading. In: BARZILLAI, M.; THOMSON, J. M.; SCHROEDER, S.; van den BROEK, P. (Eds.), Learning to read in a digital world, p. 57-90, 2018. John Benjamins Publishing Company. https://doi.org/10.1075/swll.17.03wyl
CORDÓN GARCÍA, J. A. Libros electrónicos y lectura digital: los escenarios del cambio. Palabra Clave, v. 7, n. 2, p. 1-2, 2018.
WOLF, M. Cómo aprendemos a leer. Historia y ciencia del cerebro y la lectura. Ediciones B, 2008.

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